quarta-feira, janeiro 30, 2002

... dar tempo ao tempo


No princípio era o tempo. O tempo tinha o tempo todo ao mesmo tempo e no mesmo tempo. Como não havia tempo a perder, o tempo rebentou. O universo, mundo e vida, é o conjunto de fragmentos do tempo com a memória do tempo antes de rebentar – é um backup do sopro criador. O homem já descobriu que não há memória RAM nem ROM que processe o restore de semelhante backup. Chega-se sempre lá... sem memória. Não vale a pena perder tempo com o tempo. Dá tempo ao tempo, porque atrás de tempo, tempo vem.

... pelos dedos de uma mão


Os dígitos têm a ver com os dedos da mão. As mãos são duas e os dedos são dez. Os dígitos também. Começas a contar no dedo um e se não fosse o zero vias-te aflito para acabar a contagem. Medita: o zero é um pró-memória do fim — foi inventado para dizer que a mão acabou. E quem anda sempre com o zero à mão, escusa de se preocupar com tirar com uma mão o que dá com a outra.

terça-feira, janeiro 29, 2002

Cada cabeça, cada sentença


Toda a gente aceita a sentença cada coisa no seu sítio. Porém, o equilílibrio e a paz dependem cada vez mais da aceitação de dois ou mais sítios na mesma coisa. É a tradução proverbial da chamada teoria do caos, mais coisa, menos coisa...

sexta-feira, janeiro 25, 2002

As palavras são como as cerejas.


Puxa por uma e outra e mais outra, quase um açafate delas vem agarrada à primeira. Servem de brincos. As picadas pelos passarinhos cantam doces em nossas bocas. A polpa colorida confunde-se com os lábios e os caroços, quais balas impulsionadas pela elasticidade das bochechas, tinam nos alvos que vamos escolhendo ao sabor dos disparates.
Brincos e balas, palavra puxa palavra, ao sabor do som que a diz, a humanidade lavra a natura e cria cultura. Já chegámos à realidade virtual: a palavra, no computador, é qualquer mancha de impulsos separada pela barra de espaços. Adeus cerejas: comem-se as poucas que há alinhadas e calibradas pela gramática do consumo nas embalagens frias de uma mensagem via Internet.

terça-feira, janeiro 22, 2002

A terra a quem a trabalha e o mar a quem o pesca...


Vêm aí eleições para um novo parlamento e, consequentemente, para um novo governo. Um governo para Portugal.
Dei comigo a pensar em Portugal. Dantes dizia-se alma até Almeida. Em várias ocasiões ao longo da nossa história, circunstâncias várias obrigaram os portugueses a fazer das tripas coração para leste e a malta ia, mas não ia muito longe, porque para lá de Almeida, a alma era de outros. E depois tínhamos umas rezas e umas cantigas protectoras: Senhora do Almotão/ minha tão bela arraiana/ voltai costas a Castela/não queirais ser catelhana. Portugal é pouca terra e muita água. Terra é apenas a suficiente para nela nos aparelharmos para ir para o mar: quem vai para o mar aparelha-se em terra Mas... nem tanto à terra, nem tanto ao mar. Está certo, mas esquecer o mar, nunca. É por isso que a fronteira terreste que Deus haja esteve sempre colocada à distância ideal para não esquecer o mar. Nascemos na extrema do Douro e empurrámos a Foz do Douro até Foz do Côa, trouxemos a Extremadura para a boca do Tejo e o mar foi por aí cima até às gargantas do Ródão, alargámos Ribatejo Alentejo, subimos o Caldeirão para ver o mar no Algarve, e toca de o levar Guadiana acima, não muito longe, porque não nascemos para marinheiros de água doce...
Mas o mundo é feito de mudança Vai haver eleições para um novo governo de Portugal. De Portugal? Agora que o mar já não é solução, mas antes problema, não basta apenas alma até Almeida. Alma até Bruxelas ... de mão estendida, sem sangue na guelra, porque nosso mar já não dá peixe.

sexta-feira, janeiro 18, 2002

Mãe


Hoje é dia de teu aniversário. Como se festeja aí no céu o dia de anos? O pai fez anos no passado dia oito. Encontraram-se? Já deves saber que a nossa pobre imaginação projecta cá na terra o reencontro idílico no céu dos mortais deste mundo. Seja como for quero recordar-te um sorriso teu.
É datável. Foi em 17 de Fevereiro de 1941. Tinha eu cinco anos e cinco meses. Estávamos sós em casa. O pai trabalhava em Coimbra, o Zé, com onze anos já era marçano na loja do Zé Moca e a Lurdes aprendia costura, ambos na vila. Levantou-se um vento doido, árvores, telhados, alfaias, gados e capoeiras voavam sem destino. Ao teu lado nunca tive medo e, por isso, minha inocente e curiosa expectativa de um dia fora do comum estranhou a inquietação com que me ajoelhaste a teu lado, de mãos erguidas, a gritar o socorro de Jesus, Maria e José. Mas os nomes de Deus Jesus e José atropelavam-se à saída de teus lábios aflitos e soavam de um só folgo inquieto Judé. Ai Maria Judé nos acuda! Maria e Judé , Maria e Judé. Emendei-te com uma cotovelada tranquila: - Oh! Mãe, não é assim que se diz. É Maria e José.
Voltou a tranquilidade ao teu rosto. O sorriso que me devolveste ainda anda comigo e faz parte da substância sagrada da percepção de divino que nunca mais me abandonou.

domingo, janeiro 13, 2002

Vamos ver o invisível


Em 1993 chegaram imagens de galáxias perto dos limites do universo visível. Será que quando pusermos o pé nessas galáxias ficaremos em condições de ver o invisível? Não deixa de ser uma situação caricata: para a frente em direcção ao futuro é invisível e todos gostariam de ver; para trás, em direcção ao passado tudo é visível e ninguém quer ver. Só visto, contado não tem graça... Ainda por cima, o universo está condenado a ir para o galheiro!. Daqui a uns cem triliões de anos as estrelas começam a arder para dentro e cá por fora ninguém dá por elas. Assim contentemo-nos com as "Estrelas do Bigbrother" que ainda ardem por fora embora muito desmaiadas por dentro... Lembra-nos a sabedoria popular que nem tudo o que luz é oiro, embora haja oiro negro mas que dá luz... por pouco. Também está em vias de extinção... Quer dizer, tudo e todos estamos a caminho do fim. A não ser que até lá uma nave nos transporte até à boca de um buraco negro: espreitando talvez se veja um fio de luz no fundo do túnel...

A ti, computador, me confesso


Hoje apetece-me dizer-te, meu querido computador, que estou convencido que já era antes de nascer e que não tenho razões para deixar de ser quando morrer. Eu sei que tu pensas de outra maneira: vens aos trambulhões do mundo inorgânico, ainda te engasgas, mas acabas sempre por acertar e preparas-te para dar a resposta certa a toda a gente seja a que problema for. E a tua resposta certa, querido companheiro das noitadas de códigos, é a de que estás prestes a descobrir como funciona a união entre o corpo e o espírito e de que "coisa" se trata esta minha mania de ter sido sempre e nunca mais deixar de ser.
Bom, por enquanto, é a minha contra a tua fé. Contra?!... Desculpa lá, as "fés" não deveriam desencontrar-se, mas dão o desastroso espectáculo de andarem aos encontrões umas com as outras. Nisso tens muita razão, computador amigo, tua fé é serena, desenvolve-se entre "zeros" e "uns" e a consciência que habita algures entre os circuitos electrónicos de tuas entranhas ainda te não avisou de que quando te autodescobrires talvez já seja tarde: farás parte dessa espécie autocovencida de que, afinal, o Deus que procura é ele, o próprio investigador. Mas, "quem te avisa, teu amigo é" foi a consciência que nos expulsou do paraíso e é responsável por nos transformarmos numa espécie letal. É de tal maneira previsível esta caminhada da consciência humana para a autodestruição, que os mais avisados dos homens são os inocentes . E o que é a in(o)c(i)ência senão o antídoto da con(s)ciência . Meu querido computador, "para bom entendedor, meia palavra basta. Mantém-te na inocência...

sábado, janeiro 12, 2002

O interface


Estive horas diante do monitor para fazer este "blog". Ainda não estou satisfeito, mas estou ansioso por escrever qualquer coisa mais do que um teste.
Quando apareceram os computadores houve quem temesse que esta máquina viesse a dominar os homens. É conhecida a lei de que tudo o que possa ser feito por uma máquina deixará de ser feita pelo homem. E já há quem pergunte: o que é que um computador não pode fazer? Autoprogramar-se, talvez. Mas já andam muitos crâneos a pensar nessa possibilidade. Outros prometem implantar "chips" por baixo do couro cabeludo e trocar com os parceiros não só pensamentos mas também sentimentos íntimos. E se derem mergulhos até ao subconsciente de cada um, lá se vai a liberdade individual, pois estou convencido que é ao subconsciente que cada homem vai buscar a réstea de identidade consigo próprio que determina o ritmo da sua irrepetível singularidade.
Só, com o meu computador passei horas a configurar meu webblog. Ainda bem que ele ainda não sente: mandar-me-ia pentear macacacos e às tantas soltaria lá do fundo das entranhas de sua memória o provérbio "Quem te manda a ti sapateiro tocar rabecão". Ou outro mais apropriado à minha idade: "burro velho não toma ensino".

quinta-feira, janeiro 10, 2002

Trata-se de um primeiro teste: sérá que isto vai dar alguma coisa de jeito? Para já uma primeira explicação do título: é um neologismo que associa pró (= a favor de) + verbo (= a palavra, no sentido popular, sentencial e proverbial de que "a falar é que a gente se entende) e biota (= ser vivo que habita qualquer ponto do universo), incluindo, portanto, qualquer extraterreste que tenha acesso a esta página. Dá para entender? Se não der por hoje vamo-nos esforçar para que dê noutra qualquer ocasião.